Você considera que a experiência com liga acadêmica tem um valor importante na graduação? Acredita que faz uma diferença considerável na carreira médica? Por definição, liga acadêmica é um movimento estudantil que visa dedicar um tempo extracurricular para estudar mais a fundo determinado tema. As primeiras ligas acadêmicas surgiram em universidades americanas no século 18 e a primeira liga acadêmica da área da saúde criada no Brasil foi a Liga de Combate à sífilis, da USP, que foi criada em 1920. Essa liga funciona até hoje e foi a precursora de um grande movimento no Brasil de ligas acadêmicas.
Todos os cursos podem ter ligas acadêmicas, mas, nos cursos da área da saúde, o movimento de ligas possui muita força devido a grande diversidade de conteúdos que são ministrados durante a graduação e a falta de flexibilidade na montagem da grade curricular, que, principalmente em medicina, não possibilita escolher muitas matérias específicas em áreas de maior interesse.
As ligas acadêmicas são um grande instrumento de protagonismo do aluno na sua própria graduação. É uma forma legal de se institucionalizar uma atividade acadêmica que pode te dar liberdade para criar projetos de pesquisa, extensão, estágios, eventos e até mesmo mudar os padrões chatos e tradicionais de aulas que ainda existem em algumas faculdades.
A liga acadêmica é um movimento estudantil centenário. Curricularmente falando, ter uma liga no lattes pode te dar alguns pontos na residência médica, mas no mercado de trabalho em si não trás um grande diferencial. A maioria dos alunos saem com até mais de um certificado de liga no currículo. Existem milhares de ligas de medicina no Brasil. Só na faculdade de medicina da UFMG são 52 ligas cadastradas.
Durante o início da minha graduação, como é muito comum de ser ver, eu passei por uma momento bem traumatizante da minha vida. Pela primeira vez na vida eu estava estudando muito e não estava conseguindo entender o conteúdo. Eu havia entrado em um loop que levava minha autoestima lá pra baixo e eu não acreditava mais que eu poderia aprender as matérias da faculdade.
Cheguei até a ir em um psiquiatra pra ver se eu tinha algum problema cognitivo! A estrutura educacional da faculdade estava me consumindo e não me deixava aprender como eu gostava de aprender! Nessa consulta com o psiquiatra, que ficou comovido com minha causa, ele me disse uma frase que eu levei pra vida e faço questão de passar pra frente sempre que posso que foi “não deixe a faculdade te atrapalhar a aprender”.
A partir daí, passei a focar mais no meu aprendizado e nas coisas que eu gostava de fazer dentro da faculdade do que nas minhas notas propriamente ditas. Decidi ser o dono, o protagonista na minha formação e criar um ambiente mais agradável pra eu sobreviver ali dentro. Uma das coisas que eu resolvi criar foi a Liga Acadêmica de Feridas, a LAF. Nela eu pude colocar tudo que eu acreditava que seria legal na formação do estudante de medicina.
Pra começar, o tema da liga não é uma especialidade médica! Ligas de especialidades ficam muito nichadas e perdem a característica de conexão, de conjunto, de”Liga”. Ter um problema como temática me permitia colocar a cirurgia plástica, vascular, enfermagem, fisioterapia, medicina da família e comunidade, dermato, todo mundo junto, pra falar de cuidado com o paciente. Isso pra mim era ouro. Além disso, a proposta era de protagonismo estudantil, então os alunos davam as aulas e levávamos professores para assistir e debater. A aula não era expositiva, era baseada em casos clínicos que os próprios estudantes viam nos ambientes de prática. E, por falar nisso, tínhamos prática! Muita prática! Conseguimos ambientes riquíssimos de estágio.
Além disso, podíamos levar o conhecimento que estava sendo construído para o meio científico e pra população através das ações de extensão e produção científicas. Foi aí que tive meu primeiro contato com a pesquisa e produção científica. Meu primeiro livro publicado foi o livro “Suturas” e ele virou um best seller justamente por causa da filosofia que estava por trás dele. Nós fizemos um livro que proporciona a qualquer pessoa aprender suturas, que é um procedimento mecânico, apenas lendo um livro. Nós validamos a didática do livro com o porteiro do meu prédio. Só quando ele conseguiu ler, entender tudo e fazer todas as suturas e nós manuais do livro, nós publicamos a primeira edição. E foi um sucesso! Vendemos a primeira edição do livro em 8 meses para pessoas em todos os estados do Brasil.
Certamente a LAF fez total diferença na minha formação, não só por causa dos certificados e publicações que ela me deu, mas pelos contatos e ensinamentos que obtive. Pude aprender da melhor forma possível: na beira do leito! Pude conversar com muitos profissionais de todas as áreas possíveis. Vi os reais problemas do dia a dia da assistência. Isso sim, me equipou pra sair mais preparado e muito mais seguro pro mercado de trabalho. Mesmo não tendo seguido a área cirúrgica, ou de feridas, a LAF me fez um médico melhor!
Não faça ligas só por fazer, faça ligas que acrescentem na sua vida e que tragam algo mais que só um certificado ou um título bonito. Busquem ligas que tenham projetos de extensão, estágios, produção científica vinculados e que a proposta acadêmica seja compatível com o que você acredita porque serão exatamente essas coisas extras que você vai fazer que melhorarão seu network e trarão mais conquistas que abrirão portas no futuro.
Se você faz ou já fez parte de uma liga acadêmica, compartilhe aqui com a gente o quão relevante foi/está sendo essa experiência na sua trajetória acadêmica.